segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Os Duplos



Insônia outra vez. Dicotomias eternas. Dormir ou ficar acordada? Perverter a regra do sono parece o primeiro passo para perverter todo o resto.

Na ausência do conforto escuro, a cabeça se preenche de idéias, pensamentos. E todos com um traço comum, um fenômeno interessante: duplas possibilidades, duas alternativas. Nunca vários, sempre aos pares. Pensamentos dicotômicos.

Falar ou não falar? Definitivamente, no meu caso, escrever. Mas, se falasse o que sinto, o que realmente desejo, seria interpretada da forma certa ou teria como resposta teus movimentos de ostra? E, se falo, que faço com seus silêncios infinitos de dois dias, o seu fechar-se para refratar?

O caminho leva, claro, a outra dicotomia. Os sinais que vêm de você e me confundem. Que ora me atraem, ora repelem. São acenos de aceitação, um abrir de braços para que ali eu me encaixe, me molde, me perca e me encontre? Ou são reflexos de alguma coisa que não compreendo, respostas do que você vê em mim, dos segredos que existem em você, possibilidade do que é delicioso manter, mas jamais consumar?

E então, mais uma bifurcação: te ver ou não te ver? Para mim, um desejo claro e latente. Não há outra possibilidade de tornar real o que já é lírico só quando imaginado, quando desenhado a fundo na minha existência diária. Mas há duas pontas neste laço e para que se ate, a outra ponta precisa fazer um movimento em minha direção. Enquanto isso, permaneço fio solto, ao vento do acaso e das suas vontades de me admitir em seu mundo ou me congelar no meu.

Existo ou não existo? Onde você acomoda a minha imagem? No plano real, onde devo assumir a forma de uma possibilidade concreta a ser conferida. Ou como uma dúvida, uma vontade distante, um plano interessante, mas de difícil e intricada realização?

Saber ou não saber? Abro meu mundo, meu espaço, meus pensamentos e te dou o saber de mim. E eu, o que sei? Quase nada. Sei que você planeja, desconfio que tema, sei que às vezes sofre. Dos motivos, não sei nada. Intuo por querer saber. Mas sou mais sua do que você é meu.

O caminho tortuoso que me trouxe aqui se duplica mais uma vez. Se você não vem em minha direção, por que não ir até você? Simples. Mais uma dicotomia. Talvez o meu desejo não seja a sua vontade.

E então, a última e mais difícil parte da estrada que novamente se divide: seguir em frente, tomar o atalho que me leva a você? Pegar o desvio que me afasta? A dor e a alegria intuídas seriam ampliadas se fossem, finalmente, possíveis? Olho as placas na noite iluminada da ausência do meu sono e concluo que esta é uma decisão que só se pode tomar aos pares.

8 comentários:

Carlos Patrício disse...

A ilustração dos dragões entrelaçados me fez lembrar como me incomoda o símbolo do meu (incômodo) signo zodiacal: os dois peixes de caudas atadas uma à outra, cada um olhando para um lado (da questão? da vida?) e sem chegar a lugar nenhum, um preso pela teimosia do outro.

Nesses tempos de vidas on-line, fakes, disfarces, de emoções informatizadas e desejos sem lastro, a dicotomia em relação à vida "real" faz a gente perder o sono. Mesmo.

Parabéns, Denise. Você exprimiu a ansiedade de muita gente de uma forma crua sem perder o lirismo, sensível demais, inteligente toda vida, perfeita.

Dois beijos pra você.

karina.arq disse...

Dê, amei o seu texto... Muito real, muito bem escrito... Se encaixa tão perfeitamente com o que estou vivendo nesse momento que vc não faz idéia... Identificação total. Milhões de dúvidas na cabeça e a única certeza de que só conseguiremos achar a resposta juntos.
Virei (mais) fã e voltarei sempre.
Parabéns pela sensibilidade.
Super beijo

Sheyla Amaral disse...

Parar na esquina e pensar em qual caminho seguir é sempre tão difícil, não tem placa de retorno, e mesmo se voltar na contra-mão, o caminho já é outro.

Paulo Mota disse...

Após me inteirar das incertezas da personagem insone, não consigo evitar de pensar no objeto dessas dúvidas.E se ele, também, viver o mesmo impasse? Isso geraria não bifurcações na extemidde de um caminho, mas paralelas.Aquelas que não se encontram nunca. E isso, por kafkaniano que pareça, também é uma decisão que se deve tomar a dois. Por isso que afirmei, em outra oportunidade: é um texto intrigante.

Denise Ravizzoni disse...

Isso mesmo, Paulo... Essa estrada pode ser uma armadilha, ou uma conversão completa e total... E quem está nela arrisca, põe todas as fichas e paga pra ver, ou sai do jogo, se acovarda, se acomoda?? Quem sabe?

Daniel Leite. disse...

o Amor e suas expectativas!! sempre se espera algo em troca, um carinho uma revelação!!!

muito bom seu texto!!

Rodrigo Souza disse...

Se não tentar, nunca vai saber.

Luiz Gonzaga B. Jr. disse...

Lembrei-me de Shakespeare e de Descartes. Alguma coisa aconteceu depois deste!! Beautiful!!