quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Coraline e o mundo secreto - eu quero ver!!!








A história de Coraline Jones e sua aventura pelo “Outro Mundo” foi criada e publicada por Neil Gaiman em 2002 sob o título Coraline, saltando direto para a lista de best-sellers do New York Times, vendendo mais de 1 milhão de cópias e sendo traduzida em 30 línguas. “Quis escrever um livro sobre o que significa ser corajoso. Trata-se de estar apavorado e fazer o que precisa ser feito, apesar do medo e dos obstáculos”, revela o autor. “Também quis expressar que, certas vezes, as pessoas que nos amam podem não nos dar toda a atenção de que precisamos, e certas vezes aqueles que nos dão toda a atenção necessária podem não nos amar de maneira saudável”. Enquanto escrevia a história, Gaiman acompanhava com interesse o trabalho do diretor e animador Henry Selick (“O Estranho Mundo de Jack”). “Henry estava no meu radar como uma surpreendente força criativa. Então, quando terminei o manuscrito de Coraline, pedi que meu agente o enviasse a Henry. Isso aconteceu em torno de 18 meses antes da publicação do livro.” Henry Selick revela: “Quando li o manuscrito, fiquei impressionado pela justaposição dos mundos – aquele em que vivemos e aquele em que a grama é sempre mais verde. Todo mundo pode se identificar com isso”. Uma semana depois de receber o material, Henry concordou em participar do projeto. “O produtor Bill Mechanic – que já havia trabalhado com ele – comprou os direitos do filme, e Henry começou a trabalhar imediatamente no roteiro”, conta Gaiman.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Dicionário


Abismo. Abstinência. Ácido. Amargo. Aprofundar. Apunhalar. Aturdir. Beijo. Bélico. Bifurcação. Catalisar. Cativo. Deserto. Desintegrado. Desmoronar. Destruir. Egoísmo. Empecilho. Engano. Esquecimento. Febre. Ferida. Fragilidade. Frio. Gesto. Gilete. Guerra. Hibernação. Humano. Ilógico. Inacabado. Incerto. Incompleto. Intempestivo. Lábios. Labirinto. Limite. Machucar. Mistério. Necessidade. Nocivo. Obscuro. Olhar. Oráculo. Pacto. Perverso. Pornográfico. Possuir. Punhalada. Quase. Quente. Reabrir. Recordação. Ressentimento. Sabotagem. Sofrer. Solidão. Tarde. Tempo. Tudo. Úmido. Vampiro. Xiita. Zombar. Zoom.

Releituras


Estava relendo o blog de um querido amigo. Ele escreveu sobre os motivos que nos fazem gostar da vida, querer ficar vivos, e essa coisa toda que esquecemos quando as notícias do nosso jornal pessoal ficam ruins. Belo texto.
Querido, anota aí na sua lista de motivos as nuvens vistas de cima quando sobrevoamos uma cidade qualquer, a bordo de um desses aviões que não caem nem viram manchete. Parecem massas de algodão mágico em mutação. É um bom motivo.
...
Em dia de releituras, peguei um dos textos que gosto - Ligéia, do Poe. Que força têm aquelas palavras. Ligéia, uma mulher inteligente, articulada, perspicaz, com profundos e expressivos olhos grandes como a lua, presa, enclausurada num corpo tomado por uma estranha doença que a faz sofrer, e mesmo assim, querendo que seu amor sobreviva à morte. Menos otimista que meu amigo do blog, Poe não deu um final feliz à Ligéia, o que não diminui em nada a beleza e a construção fantástica do conto do velho Edgar.
Gosto tanto, que transcrevo aqui um trecho. Tomara que gostem também.

"Falei da cultura de Ligéia. Era imensa. Conhecia as línguas clássicas e modernas. E as ciências. Todas. Mas eram conhecimentos profundos, espantosos. Tanto que eu me sentia uma criança primária e me deixava guiar por ela no mundo da pesquisa física, da investigação, metafísica. Parecia saber tudo, e eu me curvava diante de sua esplêndida lucidez. E eu vivia estudando, pesquisando, ilustrando sempre mais a minha mente. Realmente, eu dependia dela para tudo. Até para pensar, resolver, solucionar. Para viver.
Agora vocês imaginem a minha situação quando de repente me vi sem Ligéia. Sim, eu a perdi. E fiquei como uma criança perdida tateando a escuridão.
Ligéia adoeceu. Dia a dia, acompanhei o trabalho da morte. E lutei como um desesperado. Mas as lutas de minha esposa eram mais vigorosas que as minhas. Não há palavras com força bastante para descrever a encarniçada resistência com que ela lutava contra a morte. Ela não queria morrer.
Mas morreu.
Eu era muito seguro do amor que Ligéia tinha por mim. Na morte, porém, tornei-me mais consciente da força de seu amor. Segurando-me a mão, fez-me repetir versos compostos por ela nos últimos momentos.
Nesse poema, comparava a vida a uma peça em que a morte era o último ato. E, descido o pano, apagadas as luzes, descobre-se que a peça é uma tragédia:
‘- O homem, e seu herói, o verme conquistador.’"

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Olimpo


Deuses sempre foram cruéis. Os gregos e todos os outros. Zeus, o ‘big boss’ era mulherengo e manipulador. Gostava de engravidar mortais gostosas e se divertia jogando uns contra os outros seus pares de pantheon.
Mitos. Cercados de mitos. Somos mitos também? Mulheres com cabelos de serpentes, éguas canibais, labirintos habitados por criaturas estranhas, rios murmurantes e bichos de cem cabeças. Nada diferente dos dias de hoje.

Chego atrasado à consulta. Droga. Pago pelos minutos em que não estou presente também. Justo? Quem disse que o mundo é. Por que a mulher que ouve o que digo e diz estar me tratando seria exceção? E lá vou eu, com cara de culpa já na entrada, sorrisinho sem graça, pedir licença. Ela sorri sem mostrar os dentes e faz sinal para o sofá.
- Está 10 minutos atrasado. Mas hoje posso compensar no final.
Surpresa. Nem sempre tenho razão.

Hera foi uma vaca ciumenta. Suportava as traições de Zeus e depois se esforçava em punir as amantes do marido e seus filhos, como fez com Hércules. Afrodite, a bela, traiu Hefesto com o guerreiro Áries. Por sua vez, Hefesto era manco por culpa de Zeus, que certa vez o lançou ao solo porque o filho – sim, Hefesto era seu filho – tomou o partido da mãe Hera durante uma discussão.

Sento, me ajeito como posso e entendo que a sessão começou.
- Não foi intencional. O trânsito estava ruim, o ônibus ficou retido.
- Você acha que penso ter sido sua intenção?
- Não penso nada. Só estou dizendo que não foi.
- Você está justificando sem motivo, então?
- Olha, não estou justificando. Não me faz sentir como se estivesse na porra do jardim de infância. Foi só um comentário. Pessoas fazem comentários.
- Os meus comentários estão irritando você?
- Não estou irritado, só disse que cheguei atraso. Merda, tudo tem um significado oculto pra você?
- Você pensa que há mensagens ocultas, códigos, em meio às frases que usa?
- Olha, pára com isso. Estou tentando manter uma conversa, certo? É melhor começarmos logo a porcaria da sessão.
- Reações defensivas. Não estou acusando você de nada. Apenas observando a escolha do seu vocabulário.
- Vai pro inferno, você e seu maldito vocabulário – eu grito, com raiva, até quase estourarem as veias da minha garganta. E a luz se apaga.

Os Titãs chegaram antes dos deuses. Travaram uma guerra violenta, os deuses levaram a melhor. Os cretinos prenderam os Titãs nas profundezas. Prometeu foi condenado a ter o fígado comido todos os dias por uma águia por entregar o fogo aos humanos. Chronos devorava sua prole. O inferno dos gregos tinha três andares.

Acordo com a garganta seca, os lábios quase colados. Nenhuma saliva, o sol ainda não aquece. Febre, a febre comendo meus olhos por dentro. Um gosto estranho, muito estranho. Estava na cama, mas com a roupa que usei ontem durante o dia todo. Há sangue na camisa. Na mão, ainda tenho a pesada e cara caneta de ouro que usei para perfurar por doze vezes a garganta de Aurora, a psiquiatra. Uma estocada para cada morador do Olimpo. Encerrei o tratamento. Declarei-me paciente em alta.

Poseidon segurava um tridente e governava as ondas do mar de acordo com seu humor. Os deuses eram cruéis.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Exílio


Desde que chegou à cidade, atraíram-lhe as pontes. Não as montanhas verdes dando forma ao vale. Não o céu claro a ponto de doerem-lhe os olhos. Não os trilhos do trem em meio ao tráfego obrigando os carros a manobrar em direção ao passado. O magnetismo estava no murmúrio do rio que rasgava as ruas, escorrendo como hemorragia de um grande corte. O rio e as inevitáveis e necessárias pontes. Debruçada nas balaustradas de concreto, observava as pedras imóveis em seu eterno atrito com águas que nunca paravam.
Em seu exílio voluntário, quis mais de uma vez escalar os pequenos muros e saltar para a veia aberta que jamais cicatrizava. Mas não naquela ponte. Nem na outra, colorida por árvores, povoada de um passaredo loucamente barulhento. Ou ainda aquela com vão maior formado por retângulos inexatos onde eventuais pescadores matinais encaixavam as pernas para a paciente espera (os peixes não viriam nem nesta nem na próxima manhã, pois eram das garcinhas brancas que espreitavam margens ou ilhas formadas por montinhos de seixos).
Embora intensamente quente durante o dia, a cidade amanhecia envolta em bruma fresca. Era a hora em que fazia suas explorações, vestida como os demais praticantes de saudáveis caminhadas. Seu álibi. O que realmente queria era conhecer todas as pontes. Investigava suas origens no arquivo histórico, procurava saber quem era o ilustre personagem que lhes empresava o nome.
Pensar em nomes remeteu-lhe ao seu e ao de outra Virgínia, a Woolf, a inglesa escritora. Ambas obcecadas por margens e rios. Ela perdida em si mesma, invadida pelas águas. A outra perdida em seu universo, construindo frases atormentadas como castelos de galhos que as águas iriam logo levar. Faria ela como a outra? Encheria os bolsos de pedras e se entregaria docilmente ao lodo do fundo?
Foi numa destas caminhadas, depois de atravessar trilhos, aproximar-se do que parecia um clube, que encontrou “A” ponte. Não de concreto. Não para veículos. Madeira, cabos e cordas numa rua vazia e arborizada. Cheio de mato e mofo. Uma ponte antiga, meio bamba, as teias, produto do trabalho de engenhosas aranhas, brilhavam os fios presos nos cabos e refletiam todas as cores do mundo. “A” ponte que ligaria sua trilha ao entendimento de tudo. As águas ali eram escuras, velozes e fundas. Perfeito. Era como um imenso imã puxando cada pequena parte do seu corpo. E ela foi. Os primeiros passos fizeram a ponte sacudir suavemente. Riu do próprio medo. Era irônico. Procurou por uma falha na trama dos cabos e ali sentou, as pernas soltas, suspensas, balançando, como fazem as crianças em um banco alto.
Era como se entendesse naquele momento o motivo de todas as coisas, a razão de tudo, ou a falta de. Faria ela como a outra Virgínia e se deixaria levar pela correnteza sem resistência alguma? Agora, que finalmente encontrara a sua ponte, compreenderia a atração pelas amuradas, a sensação de abismo? Por um momento achou que sim. Jogou as chaves que tinha na mão até ouvir o som do objeto que encontra a superfície de impacto. Medir a altura antes de cair? Não. Não ela. Não essa Virgínia. Atravessou a ponte e seguiu para casa, sem as chaves, mas com todas as portas abertas.